Hoje em dia, sabemos que a microbiota intestinal é fundamental não só para a nossa saúde, mas também para a saúde dos nossos pets. O intestino desempenha um papel crucial, sendo responsável por cerca de 70% do sistema imunológico. A mucosa intestinal age como uma barreira, impedindo a entrada de muitas bactérias prejudiciais ao organismo e permitindo a absorção dos nutrientes dos alimentos. Esses alimentos são essenciais para as bactérias benéficas que compõem a microbiota intestinal de cães e gatos, contribuindo para sua composição e metabolismo. Essa microbiota, por sua vez, facilita a digestão e absorção dos nutrientes e a produção de compostos que influenciam a saúde dos animais【7】.
Além das bactérias, a microbiota intestinal inclui vírus e outros organismos eucarióticos que vivem no trato gastrointestinal em harmonia com o hospedeiro. Por exemplo, as bactérias produzem ácidos graxos de cadeia curta que nutrem o epitélio intestinal, enquanto o epitélio, por sua vez, produz muco que alimenta essas bactérias benéficas e protege o intestino. A microbiota intestinal cumpre várias funções metabólicas, ajuda a proteger contra patógenos e modula o sistema imunológico, afetando direta ou indiretamente muitas funções do corpo. Para se ter uma ideia, a maior parte da serotonina, conhecida como o “hormônio da felicidade”, é produzida no intestino, o que originou o conceito do eixo intestino-cérebro【5】.
Quando a microbiota intestinal fica desequilibrada, isso pode estar associado a problemas gastrointestinais. A inflamação no intestino, seja crônica ou aguda, costuma estar ligada a mudanças significativas na composição dessa microbiota. Chamamos de disbiose intestinal quando esse desequilíbrio leva a uma inflamação do intestino. Uma vez inflamada, a mucosa intestinal se torna mais permeável, permitindo que toxinas, vírus, bactérias prejudiciais e até fragmentos de alimentos não digeridos entrem na corrente sanguínea. Quando isso acontece, o sistema imunológico reage, desencadeando uma série de processos inflamatórios que podem levar a doenças crônicas, autoimunes e alergias【7】.
As principais causas de disbiose intestinal incluem o uso excessivo de antibióticos e antinflamatórios, períodos prolongados de estresse【3】, baixos níveis de vitamina D【1】 e desnutrição【4】. Como resultado, podem surgir inflamações no intestino e em todo o corpo, aumento dos níveis de amônia, sobrecarga do fígado e rins, aumento de coceira, problemas digestivos, má absorção de nutrientes e alterações no sistema imunológico e neurológico【8】.
Visto que o desequilíbrio da microbiota pode causar inflamação e afetar o sistema imunológico, estratégias para modulá-la podem ser muito úteis no tratamento e na prevenção de várias doenças. Há vários nutracêuticos e práticas que ajudam a manter o intestino saudável, começando por uma alimentação equilibrada. Além disso, probióticos, prebióticos e posbióticos desempenham um papel importante na manutenção da saúde intestinal. Hoje, vamos falar um pouco sobre esses elementos:
Probióticos são microrganismos vivos que, quando administrados nas quantidades corretas, trazem benefícios à saúde. Eles atuam tanto no lúmen quanto na mucosa intestinal, interagindo com células imunológicas, enterócitos e outras células através de receptores celulares e outras vias de comunicação. Os probióticos ajudam a fortalecer a imunidade, aumentando a produção de IgA e melhorando a resposta às vacinas. Também são importantes na modulação da imunidade, no tratamento de doenças autoimunes e alergias, além de agirem na barreira epitelial do intestino e estimularem a produção de muco. Eles podem ajudar a restaurar esta barreira, protegendo as células intestinais durante a inflamação, reduzindo a permeabilidade e diminuindo a translocação de bactérias, além de melhorar a digestão dos nutrientes[9].
Os prebióticos, por sua vez, são carboidratos não digeríveis, principalmente oligossacarídeos, obtidos de matérias-primas vegetais [6], que trazem benefícios à saúde do hospedeiro. Eles são degradados pela microbiota intestinal, servindo de alimento para as bactérias benéficas. Os produtos desta degradação são ácidos graxos de cadeia curta, que entram na corrente sanguínea e que podem beneficiar não apenas o trato gastrointestinal, mas também outros órgãos. O uso de prebióticos oferece vários benefícios, como a melhora da composição da microbiota intestinal, a redução de substâncias tóxicas no intestino e a otimização da produção de ácidos graxos de cadeia curta[2].
Para serem eficazes, os prebióticos precisam resistir à digestão e chegar ao cólon, onde estimulam seletivamente o crescimento e a atividade de espécies microbianas que trazem benefícios ao hospedeiro. Além disso, os efeitos dos prebióticos podem ser potencializados quando combinados com cepas probióticas específicas, formando o que chamamos de simbióticos [6].
Outro conceito interessante são os posbióticos, que são metabólitos ou componentes produzidos pela microbiota e que tem um impacto positivo na saúde. Quando se ingere prebióticos, as bactérias intestinais os fermentam, e os posbióticos bioativos são subprodutos desse processo de fermentação. Embora muitos estudos já tenham mostrado as vantagens dos posbióticos, ainda se está tentando entender exatamente como eles são produzidos e quais são seus impactos na saúde. Alguns exemplos de posbióticos incluem nutrientes como vitamina B12, vitamina K, folato e vários aminoácidos produzidos por bactérias intestinais. Outros exemplos são lipopolissacarídeos, enzimas, ácidos graxos de cadeia curta e lisados de bactérias. Embora os mecanismos precisos ainda estejam sendo estudados, pesquisas in vitro indicam que os posbióticos têm propriedades antibacterianas, antinflamatórias, imunomoduladoras, antiproliferativas e antioxidantes [10].
Concluindo, o uso de substâncias prebióticas, probióticas e posbióticas é uma estratégia eficaz para modular a microbiota intestinal, melhorando a saúde intestinal, a função imunológica e, por consequência, a saúde geral dos nossos pets.
REFERÊNCIAS:
1) CANTORNA, M.T. et al. Vitamin A and vitamin D regulate the microbial complexity, barrier function and the mucosal immune responses to insure intestinal homeostasis. Crit Rev Biochem Mol Biol. April, 2019; 54(2): 184–192. doi:10.1080/10409238.2019.1611734.
2) DAVANI-DAVARI, D. et al. Prebiotics: Definition, Types, Sources, Mechanisms, and Clinical Applications. Foods 2019, 8, 92; doi:10.3390/foods8030092.
3) HAWRELAK, J. A.; MYERS, S. The Causes of Intestinal Dysbiosis: A Review. Alternative Medicine Review, Volume 9, Number 2, 2004.
4) KUMAR, M. Gut Microbiota Dysbiosis is Associated with Malnutrition and Reduced Plasma Amino Acid Levels: Lessons from Genome-Scale Metabolic Modeling. Metab Eng. 2018 September ; 49: 128–142. doi:10.1016/j.ymben.2018.07.018.
5) PILLA, R.; SUCHODOLSKI, J.S. The Role of Canine Gut Microbiome and Metabolome in Health and Gastrointestinal Disease. Frontiers in Veterinary Science. V. 6, n. 498, Jan, 2020.
6) PINNA, C.; BIAGGI, G. The Utilisation of Prebiotics and Synbiotics in Dogs. Italian Journal of Animal Science, 13:1, 3107 (2014) DOI: 10.4081/ijas.2014.3107
7) WERNIMONT, S.M. et al. The Effects of Nutrition on the Gastrointestinal Microbiome of Cats and Dogs: Impact on Health and Disease. Front Microbiol. June, 2020; 11: 1266. doi: 10.3389/fmicb.2020.01266
8) WEISS, G. A.; HENNET, T. Mechanisms and consequences of intestinal dysbiosis. Cellular and Molecular Life Sciences (2017) 4(16):2959-2977. DOI: https://doi.org/10.1007/s00018-017-2509-x
9) WYNN, S. Probiotics in veterinary practice. Vet Med Today: Timely Topics in Nutrition JAVMA, Vol 234, No. 5, March 1, 2009.
10) THORAKKATTU, P. et al. Postbiotics: Current Trends in Food and Pharmaceutical Industry. Foods 2022, 11, 3094. https://doi.org/10.3390/foods11193094
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